No Dentro e no Fora – a Mãe Ideal, a Idade Real, o Amor Ideal e a Minha Própria voz.


Ao esvair evasões, a Vida espairece dos espasmos.
A voz ideal sai do ilusório útero, adentra o berço das reais veracidades e o vazio começa a encolher de cheios.
***
Vidas iludidas construídas sobre o molde socrático da perfeição.
A Mãe Ideal, onipotente onisciente onipresente (Não existente!). Uma Mãe capaz de preencher todas as necessidades, todos os buracos da minha, da tua, da nossa tenra terra imatura, de acalantar meus alvoroçados transbordados esparramados pensamentos – meio/bastante irreais: delírios irracionais e plausíveis no quase.
No ainda velejam veleidades, vaidades veladas em manipulações onerosas, vexatórias, dispendiosas…
Muitas faces passaram por minha frente, por minha fronte, e foram vitimizadas pela vítima maior: eu mesma, a pobre coitada, quem agora convalesce doente de si, de seu próprio ego destruído em colisões, em brigas com a realidade, com a real idade – a minha, a da Terra, a da Verdade.
***
A minha real idade é a do bebê interno. A minha real idade é a da velha que xinga. Xinga o bebê que chora e ao mesmo tempo o consola, sendo sua mãe tão seca maldosa. Seca voz que me chama para que eu nunca me esqueça: eu sua a média entre o bebê e a velha.
Esta voz grita-me querendo sair daqui, deste buraco escavado arranhado. É a minha voz, a voz da mãe, do bebê, da moça, da velha, da mulher que sou em vermelho menstruação.
Fértil, gero-me. Gero fértil minha vida, consolo para minhas fraquezas tão, tão verdadeiras quanto a minha força cuja força eu supunha esquecida. Esta força me faz lutar a cada instante contra a dor reaparecida no incessante.
Não por acaso escavo buracos.
Não por acaso busco esconder-me num eterno ventre.
Todos os animais se recolhem quando machucados.
No esconder-se a cura se realiza.
***
– Entre as linhas dos asteriscos, (a)risco-me numa digressão –
Reação normal. Quem convenciona o normal? A meu ver, normal é a Seleção Natural e o fazer dos animais, embora sejam de elevada agressividade quando atacados. Mas nós também não somos assim? Não, nossa agressividade é gratuita.
Sábios em suas curas, zelosos em suas mortes, os animais são esquizofrênicos – fato comprovado. Considero isto normal? Caro! Eles são naturais, são como a natureza manda, sem respeitos, sem rodeios. Nós, humanos, é que somos contra. A favor estamos do taxativo DMS¹, dos redutíveis códigos do CID10² restringindo à números nossas loucuras.
(Meu diagnóstico: Disfunção Aguda do Padecimento Poético Não-Genético Pré-Nascença. CID:  Aleph  ∞ . + 1  – Doença não medicável: necessita afastamento incomensurável.)
Por que este modo de proceder? Quem são os grandes culpados de estória? Nossos sentimentos e sensações?
Em toda sua pressuposta irracionalidade, os animais são mais sensíveis do que a gente. São parabólicas inescrupulosas, andando, rastejando, nadando, voando pelos seus dizimados terrenos, os quais não são perfurados de buracos imaginários.
Eles são completos, não discretos, retos. São tétricos? Não. Fazem aquilo que podem dentro de seus limitados limites. E nós? Nada fazemos dentro de nossos ilimitados limites. Se nos tornamos perfeccionistas na bebezisse, somos nossas mães desde o nascimento. Somos nossos ódio e amor. Somos nossos Tudo e Nada numa mesma pessoa machucada.
1: DSM: Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders
2: CID10: Classificação Estatística Internacional de Doenças
***
Ciente estou de que minha dor irá embora ao florescer o meu amor – amor diferente do Ideal de Amor, pois consiste num amor ideal, verdadeiro, altruísta e egocêntrico no inteiro.
Tento tanto me proteger que canto mentiras para enganar o amor dos Outros, entre este tanto, amo muito e muito amo quem não vejo. Mas o meu altruísmo, farto preso aqui dentro deste peito, está com medo de se mostrar.
Preciso primeiro (ou segundo) crescer, a fim de no externo amar a mim, a ti, a ele, a nós, a vós, a eles? Aí está a minha cura, longe do raciocínio já muito gasto de dor de horror. Minha vida espera tácita este acontecimento tão… Tenho que falar! Falar para o mundo que eu também sou o mundo e dele gosto de fazer-me parte.
***
Brotando a noite, um amor calmo começa constante a desabrochar. Escrevo perguntas em suas pétalas infantes, com infantil hebefrenia elas respondem em neologismos. A criança em mim apreende compreende e traduz para a velha ignorante – Quem sou, posso ser ou virei a ser neste breu pouco ideal? Ainda minha mãe? Ainda minha filha? Sim e não. No igualmente sou (posso ser, virei a ser) o Eu, só e mente.
Logo me faço, no momento, o meu amor ideal, aquele cujo objeto também é eu mesma.
Logo minha auto-estima cresce, minha falta de estima adormece, porquanto forte fortaleço na madureza, na dureza. Breve conseguirei proteger-me no fora deste casulo sem furo.
***
Sou minha metáfora.
Sou a magreza engordando da força quente que cai no vazio frio do renascer.
Sou a voz que tento protela no aparecer.
***
Quando compartilhamos do estado tranqüilo, minha voz ideal reaparece na corroboração entre o Eu e a Natureza. Assim e pois, o Eu relaxado fala de bebês, filhotes; encanto-me com o gosto de vê-los brincar. Cinco (ou mais) sentidos ávidos por informações, estímulos da Mãe Ideal, do amor. Eles são como são.
São uma de nossas mutações genéticas? São novas combinações? São novas interações? Não, são novinhas pessoinhas no aprender a viver. Olhando o mundo com admiração poética, olhando a vida com esperança das possibilidades.
Possibilidades sobre as quais voei e no agora envelheço. Envelheço porque meu cerne é novo enquanto a carne perde seu vigor – isto sim é o sumo supremo envelhecimento.
Ganho cada vez mais horas onde a brincadeira não se faz presente. Ganho presentes de seriedades. Minha vida está tão sisuda, tão antipática, ao ponto de só me permitir sorrir para crianças. Elas merecem sorrisos, não usam disfarces nas faces feito adultos. Adultos encapotam-se em egos inflados a fim de conseguir sobreviver neste árduo árido terreno que é o viver. Não condeno, entendo.
***
Quero saúde, ganho velhices.
Quero paz, ganho berros.
Quero voz, ganho mordaças.
Quero alívio, ganho cargas.
Quero meninice, ganho dentes cerrados e uma boca fechada aos risos e guizos das perdidas brincadeiras.
(Só)soçobro-me em conformações.
No para sempre serei um bebê dolorido na procura pela Mãe Ideal, desencontrada na oferta, pois a demanda foi excessiva. No para sempre serei uma voz perdida e achada, voz de luta de brisa de canto de concreto é de certo extraviar-se e deparar-se escondida e exposta. No para sempre serei a velha e a menina cantando contos encantos no uníssono do coral amigo concebido como parte de mim.
Sou no para sempre e sempre fui pássaro livre, que de tanta liberdade cansou, pousou, foi pego, engaiolado e hoje persiste na luta pelo seu Eu, o Eu Mesmo – mesmo esburacado.
***
Já que não tem jeito, deste jeito sem jeito, grito bem alto para escutar-me de bons fatos. Minha audição anda apurada para os bons atos.
Ajo mais no ainda e penso menos nos de sem solução.
O diálogo entre minhas partes permanece no perene. A moça vai (trans)formando-se num forte fortalecido na voz, e eu vou até o forte reconhecê-la como sendo eu mesma. A velha nina o bebê e a paz se restabelece no dentro. No fora apenas utilizo o respeito no ato no fato e no então paro de gritar. Consigo-me no pensar baixo e indolor. Em tom de prazer minha carne fala com o mundo e dele eu gosto – degusto o gosto de fazer-me parte deste atrito miraculoso.
Da realidade extraio verdades temporárias, assim como das pessoas que nela estão. Posso extrair-me me doando. Aprecio este estar de bem com o relativo. No absolutismo onde vivi as verdades eram absolutas, contudo, não havia em absoluto a minha real idade.
Saio do casulo para voar e quero. Quero-me no querer juntar-me aos outros.
Suave, canto-me em suavidades.
Suave com a vida que mereço, suave com a vida que me merece. Suavemente percebo que a vida merece. Percebo ter o que dizer. Percebo ter o que aprender.
Usando-me de apreços, ouço em realejo uma qualidade aparecer: a humildade para-com-perante a realidade.
Usando-me de estimas, a latência das defesas começa a desaparecer. Manifestadas, sem ser pisoteada, capacitam-me a viver.
A moça, meu ego, singelamente surge forte daquele forte e sem preconceitos. Afinal, quem seria eu para cogitar o pré-conceituar? Visto que de um pouco de tudo experimentei e menor do que tudo fiquei.
***
Assim sendo assim, já que não teve jeito, tive de renunciar o Perfeito.
Assim sendo assim, depois e pois fui galgando a conquista dos meus muitos, muito desejados diretos…
…Ah, o quê? E os animais? São esquizofrênicos? Sim! Eu, tu, nós talvez sejamos ou poderíamos ser. Porém a cura não mais me parece tão milagrosa assim. Junto ao crescimento do adulto vem a cura emocional – a racional não é necessária.
Aliás, a minha voz (in)surgiu? Todas (in)surgiram e cantaram em cada canto de cada verso. A voz imediata que vos fala, a voz engelhada que falou, a voz deslizada que falará, elas são minha voz própria, são minha própria voz – poética prosaica retórica reflexiva ativa. Há ainda aquela voz calada falada no presente onde sonho, anseio, odeio, amo, choro rios e sorrio.
Uma voz: Surte!
A minha voz: Não! Não! Não!
Quero-me simples, quero-me simplesmente ser aquilo que de meu ego sair. Se vier um riso, eu acolho. Se vier um cisco, eu recolho. Se vier um choro, eu acolho. Se vier um engodo, me recolho. Se vier uma flor, eu a-colho. Por hora não me encolho. Acolhendo-me posso acolher a vida, porque nunca me senti tão viva quanto no agora.
A Mãe Ideal foi desaparecendo, cedendo o lugar à mãe que tenho e amo, mas que entre o tudo é cheia de defeitos acolhidos por um Eu o qual também não é Ideal.
Alívio da imperfeição. Como é bom errar e estar viva para consertar!
***
Cheia de esperança, embora no ainda com parcos passos, passeio passos pesados, pragmáticos, passos passando pé ante pé ante pó na direção da realização. Isso é passado é presente é futuro, ao passo que no real cobiço caminhar e caminho destinando-me bem longe daqui.
Os passos em destino ao Mundo são lentos. Dependem do querer, daquilo que se quer, de uma Sociedade, de uma real idade. Dependem de quanto tempo passou-se sem treinar estes passos além de complicados.
Ressalvo-me: sou voraz. No às vezes, por vezes, ando rápido demais. Mas mesmo caindo continuo, saio por uma brecha, estou certa de conseguir-me no chegar ao meu rumo.
Cubro-me com rituais para proteger-me. Em poucos, pouco em pouco, eles vão desfazendo-se nos passos que me adentram no fora.
***
Encontrei a mãe, a filha, o amor, a verdade, a voz, a real idade, – sem idealizações socráticas – na prática adquirida na integração das minhas partes em interação com a vida.
Karina Viega
Published in: on 26 de janeiro de 2011 at 3:00 PM  Comments (13)  

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13 ComentáriosDeixe um comentário

  1. parte dos nossos ilimitados limites é não deixar vir a tona esses textos obscuros e que ficam em um cantinho esquecido da nossa alma.

    com a gaiola aberta, passarinho canta muito mais.
    =)
    carol ruas

  2. Acolho o conselho, todavia discordo do contexto.

    Entre o tudo que poderíamos ser, nada fazemos dentro de nossos ilimitados limites. Assim e pois, a energia em potencial latente transmuta-se numa angústia em cinética manifesta, logo o Passarinho canta esta angústia ao invés de torná-la uma fala entupida – Afinal, o que além ele poderia fazer se a máxima saúde é pretender usar a voz?

    Passarinho na gaiola pode ser que não cante o mais, mas canta o muito do desejo de vida.
    A vida não vivida é vívida de possibilidades, enquanto a vida no fora aterroriza e cola o canto na unificação dos sonhos despedaçados.

    Passarinho na gaiola tem o canto da faca no palo seco sedento do porvir. Passarinho no fora tem a decepção de auroras, pois sabe a rotina do devir.
    Aquilo não vivido é bonito pelo seu desconhecido.

    Passarinho na gaiola tem o canto que corta numa Ária para Cordas e em seu muito nos consola ao explicitar os acordes dos anseios de todos tão presos no dentro de si.
    Todos são seus próprios cativos prisioneiros, mesmo quando desfilam faceiros egos encapotados pensando esconder o fato. Contudo, simplesmente somente sustentam uma mentira de alento.

    Passarinho na gaiola canta o perfeito. Passarinho no fora canta os defeitos.

    Porém, no para sempre, há quem confunda ou não discerne os sentidos dos cantos.

    beijos de passarinho.

  3. Ká, até a sua resposta faz a gente se sentir uma besta em frente ao que vc escreve!
    êee orgulho da minha menina de ouro dos cachos dourados!
    muito bom!

  4. Você diz ter inveja dos meus skills musicais, mas a música verdadeira é vc!
    vc canta aquilo que eu cantaria se tivesse capacidade de verbalizar o que penso…

    “Possibilidades sobre as quais voei e no agora envelheço. Envelheço porque meu cerne é novo enquanto a carne perde seu vigor – isto sim é o sumo supremo envelhecimento.
    Ganho cada vez mais horas onde a brincadeira não se faz presente. Ganho presentes de seriedades. Minha vida está tão sisuda, tão antipática, ao ponto de só me permitir sorrir para crianças.”

    doeu…

  5. Amore,
    Doer é bom!
    Só quem vive sente dor…
    ^^

  6. “Mas mesmo caindo continuo, saio por uma brecha, estou certa de conseguir-me no chegar ao meu rumo.”

    Não te conheço pesssoalmente, mas leio assiduamente o que vc escreve. Por isso, seja lá qual for seu rumo, certemente esta “voracidade” que vc passa atraves dos textos irá te levar até lá.

  7. Este Passarinho na gaiola REALMENTE tem o canto que corta.
    Resolvi acessar um link por aí com uma foto interessante e fui bombardeada!
    Parabéns.
    Faço letras, porém não escrevo tão bem assim.
    quando virá o próximo?
    não tenho facebook,
    gostaria que vc entrasse em contato comigo por e-mail
    tenho uma proposta a fazer
    bjo

  8. Obrigada, Anna.
    entrarei em contato sim.

  9. Pô, karina, quem te deu autorizãoção para falar para o mundo aquilo que eu escondo calado?
    Maravilhoso!
    Quando virá o proximo??
    Vamos, quero mais!!
    Beijos

  10. Breve,
    é só meus dedos ficarem despreguiçosos para o teclado…
    Já está pronto.
    (Aliás, a meu ver, é o melhor da série “Mães”)
    Entrementes odeio digitalizar aquilo que foi tão sexualizadamente escrito pela caneta-falo num papel antes calado, depois verbalizado.
    Lindo ato. Catártico fato. ^^
    beijos, xuxu.

  11. Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu Nabu foi na floresta caçar borboleta encontrou uma velha com a mão nabu

  12. twenty years after as much as twenty years after in as much as twenty years after after twenty years and so on it is it is it is it is as if it or as if it more as if it as more as more as if it and if it and for and as if it

  13. […] Trechos de meus tresloucamentos verbais: Fiz Pouco Caso – Faço um Retrato em Retrataçãoe No Dentro e no Fora. […]


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